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Opiniões expressas nesta coluna são dos autores e não necessariamente refletem opiniões dos apoiadores ou colaboradores da Associaçao Cidade Escola Aprendiz.

O texto “Desrespeito ao ECA nas Conferências Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente” foi escrito pelo estudante Leonardo Cordeiro, que integra a Poligremia, um coletivo autônomo e horizontal de grêmios estudantis de escolas públicas e particulares.

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O centro de convenções do Anhembi foi palco, no final do ano passado, de um enorme desrespeito aos direitos das crianças e adolescentes, promovido pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA), que deveria zelar por eles, e pela Prefeitura de São Paulo. Aconteceram ali, nos dias 29 e 30 de novembro e 1 e 2 de dezembro esvaziadas Conferências Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente, realizadas bienalmente.

As conferências deste ano, divididas entre a lúdica (de que participam as crianças e adolescentes) e a convencional (dos adultos), estão entre as piores já realizadas na cidade, que no passado já foi exemplo para o resto do país nessa questão.

Quem foi à conferência lúdica encontrou o auditório de 2500 lugares alugado com dinheiro público vazio, com algo entre uma e duas centenas de delegados, quando se esperava mais de 400. Na conferência convencional, o total de presentes não era muito maior que 100. Mais de uma região não compareceu com nem uma pessoa.

Não havia ninguém preparado para dar as oficinas para crianças e adolescentes. Várias regiões foram prejudicadas por atrasos nos ônibus contratados ou simplesmente não puderam ir porque não houve transporte. Nada tinha de lúdico o formato da conferência lúdica e a mesa, que chegou a ser destituída, tentava conduzi-la a toque de caixa, indiferente.

A história que resultou nestes quatro dias esvaziados e caóticos de conferências, entretanto, é um pouco maior. O baixo número de participantes evidencia, a despeito dos problemas com o transporte, o grau de desmobilização que se atingiu após um processo displicente de organização.

As conferências foram organizadas às pressas e com descaso, sem participação daqueles que deveriam ser seus maiores protagonistas, as crianças e adolescentes, e sem qualquer preocupação com a mobilização e as necessidades das várias regiões da cidade. Conforme os relatos dos adolescentes eleitos para participar da comissão central de preparação, o assunto foi constantemente adiado e suas opiniões e protestos eram por vezes ignorados. Prevaleceram, segundo eles, que acompanharam o dia a dia do CMDCA, a politicagem, as disputas partidárias, os interesses privados e escusos.

O cronograma oficial que estipula um período para a realização das conferências regionais sofreu dois adiamentos, o que contribuiu para a desmobilização. Não bastasse isso, os primeiros oito eventos regionais simplesmente não puderam acontecer por falta de estrutura básica como transporte e alimentação, que deveria ser garantida pela prefeitura. Em numerosos outros, a alimentação foi precária e o transporte, falho.

Ficou mais do que claro o descaso do CMDCA e instaurou-se um clima de insegurança.  A Poligremia, que se envolveu na realização das conferências em Pinheiros e no Butantã, e outras entidades de diversas regiões, começaram a organizar-se para exigir a transferência dos eventos municipais para 2012, a fim de que se pudesse estabelecer um novo cronograma e retomar do zero o processo de preparação. O CMDCA negou-se veementemente a refazer o cronograma, usando como desculpa o contrato já lavrado com a SP Turis para a utilização do Anhembi.

A rede de influência da prefeitura atuou para forçar a maioria das regiões prejudicadas a realizar suas conferências às pressas logo antes das municipais, com poucos presentes, e visando impedir uma maior mobilização por um novo cronograma.

Em meio a tudo isso, o exercício da cidadania, por meio da discussão e participação nas políticas públicas, foi negado pelos sucessivos adiamentos, pelo descaso e desorganização do CMDCA, a várias crianças, adultos e adolescentes, numa violação do próprio ECA. Entre os que conseguiram ir ao evento municipal, sobretudo os mais jovens, era grande a falta de informação sobre todo o processo.

A ausência de praticamente todos os conselheiros municipais eleitos pela sociedade civil, que decidiram por se omitir ou boicotar o evento, foi outro indício de que a situação dentro do CMDCA agravou-se bastante no último mês. Os conselheiros presentes, ligados ao governo municipal, buscavam todos os meios possíveis para garantir a realização das conferências, comprometida pelas ações do próprio conselho.

Ao longo dos dois dias de conferência lúdica, fizemos várias tentativas de esclarecer os presentes, que tornaram ainda mais claros para nós os problemas de todo o processo de organização. Ficou evidente o despreparo de muitas crianças e adolescentes, que em grande parte só conseguiam pensar em elegerem-se delegados para a etapa estadual. A idéia de invalidar ou realizar novamente a conferência era vista por muitos como loucura ou como atentado à sua participação, como se os impedidos de comparecer estivessem ausentes por vontade própria.

Conseguimos, ao denunciar a todos o despreparo e a indiferença com que a mesa, formada por conselheiros ligados à prefeitura, conduzia os trabalhos, destituí-la e formar outra, composta inteiramente por crianças e adolescentes. Se tal passo contribuiu para aumentar o caos do evento, é apenas porque escancarou a exclusão das crianças e adolescentes do processo e toda a sua desorganização.

Hoje, diversas entidades, reunidas no Fórum Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, trabalham com a possibilidade de anular na justiça ao menos a conferência lúdica, apontando o gasto indevido de dinheiro público que houve ali e obrigando a prefeitura a realizar outra, no início do ano.

Se isso for alcançado, se abrirá uma nova chance para o acompanhamento e a participação de todos nós no processo de organização, impedindo que ele seja tomado pelo descaso daqueles que deveriam nos representar. Uma nova chance para que consigamos inverter uma prática política que se perde em meio a interesses privados e à burocracia estatal, terminando por ignorar e excluir aqueles para os quais deveria estar voltada.

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