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publicado dia 5 de junho de 2012

Rio+20 e o polêmico discurso da economia verde

Por Leonardo Sakamoto, do Blog do Sakamoto

Hoje é o Dia Mundial do Meio Ambiente. E a Rio+20 está chegando… Mais alguns dias e a capital carioca será invadida por milhares de colegas jornalistas que vão acompanhar a conferência principal e as atividades paralelas. Será gravador perseguindo cocares aqui, microfones  acompanhando chefes de Estado desconhecidos ali, máquinas fotográficas disparando contra qualquer protesto que reúna mais de seis pessoas e uma ararinha azul, os diplomatas maquiando vidraças em vitrines.

De um lado, alguns querendo discutir como frear o termostato do planeta que foi ajustado por nós – ao longo de séculos de um modelo de produção insano – na posição “Gratinar o Idiotas Lentamente”. Outros questionando se ainda dá para puxar a cordinha e parar o busão ou se motorista é biruta e, agora, só se for arrancado à força pelos passageiros.

Já os discursos oficiais devem girar em torno de como avançar em uma governança ambiental global e consolidar o conceito de Economia Verde – a nova aposta de governos, players do mercado e de setores do ambientalismo.

Na definição do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, “uma Economia Verde é a que resulta em melhora do bem-estar humano e da equidade social, enquanto reduz significativamente riscos ambientais e as escassezas ecológicas”. Onde “crescimento em renda e emprego deve ser baseado em investimentos públicos e privados que reduzem emissões de carbono e poluição, aumentam a eficiência energética e de recursos, e reduzem a perda de serviços da biodiversidade e dos ecossistemas”. A Economia Verde, em suma, “sintetiza o reconhecimento crescente de que alcançar a sustentabilidade depende quase inteiramente em acertar na economia”.

A perspectiva de “salvar o que resta da natureza” via mecanismos tradicionais de mercado, no sentido de que a preservação do planeta passa a ser atrelada aos benefícios que pode trazer ao capital, no entanto, tem sido alvo de fortes críticas por parte de organizações da sociedade civil, cientistas e acadêmicos. E eles têm razão. Não porque eu não reconheça a força dos instrumentos de mercado. Quando bem ajustada, a pressão sobre investidores, compradores e financiadores têm ajudado a combater o trabalho escravo e o desmatamento ilegal. Mas quando as ferramentas tornam-se uma finalidade em si, aí a vaca tosse.

Por exemplo, o pressuposto, inerente à lógica da Economia Verde, de que a adoção de mecanismos de produção menos poluidores deve ser compensada financeiramente, é um contrassenso se a ideia é combater as mudanças climáticas. Porque em muitos casos, é tudo uma questão de compensação: quem polui demais, em vez de reduzir os danos (o que sai muito caro), paga (mais barato) para que outrem polua ou desmate menos e as contas se equilibrem no zero a zero. Economicamente, todos ganham… menos o clima e o meio ambiente.

Por outro lado, valorar financeiramente e jogar no mercado elementos intangíveis como as funções ecossistêmicas – compartimentadas hoje em um rol de “serviços” ambientais – e recursos da biodiversidade historicamente utilizados e mantidos por populações tradicionais e pequenos agricultores, cria um choque com o direito humano e universal ao meio ambiente (tão importante quanto os direitos políticos, civis, econômicos, sociais e culturais), ao que é oferecido pela natureza para a sobrevivência de todos. Em especial, confronta o direito das populações rurais e tradicionais sobre suas terras, águas, florestas e demais recursos naturais.

A premissa de que a proteção do meio ambiente só ocorrerá se for lucrativa, ou que só podemos preservar pagando por isso, enfraquece o Estado de Direito e o cumprimento da lei, assim como deixa de fora os aspectos científicos e biológicos inerentes à saúde do planeta, sociais, culturais e espirituais inerentes à sobrevivência das populações rurais e tradicionais que dependem e convivem com a natureza e seus recursos – e que cumpriram até hoje o papel histórico de preservação dos ecossistemas. Acima de tudo, nega o fato de que as crises climáticas e ambientais são decorrência direta de um modelo de desenvolvimento intrinsecamente predador e depredador (o trocadilho foi infame, mas a idéia é boa).

Enfim, vão empurrando com a barriga a solução.

Você sabe o que é mercado de carbono? Tem idéia do que seja Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL)? Já ouviu falar em Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação, Conservação, Manejo Florestal Sustentável (REDD)? Sabe o que são pagamentos por Serviços Ambientais (PSA)?

Não? Se não entendeu bulunfas dessa sopa de letrinhas, não se preocupe, você não está sozinho. A imensa maioria dos colegas de imprensa que está indo cobrir o evento também não faz a mínima idéia do que seja isso. O que é preocupante pois, como questionar a efetividade de um instrumento se você nem sabe como ele funciona ou qual sua natureza. Dessa forma, é mais fácil ser enganado. Ou cair no canto da sereia.

(A melhor parte é que, segundo fontes de dentro de ministérios diretamente relacionados com o tema, boa parte das pessoas que deveriam saber sobre o assunto no governo também não fazem idéia do que isso seja. Aí, no vácuo de conhecimento, quem tem um olho (gordo) é rei.)

Apesar de vendida como panacéia, a Economia Verde ainda carece de consenso entre os negociadores dos Estados-membros das Nações Unidas quanto à sua conceituação e definição. Seus proponentes apostam em um uso mais economicista dos recursos naturais – rebatizados de capital natural, defendendo novas regras de lucratividade inerentes à preservação ambiental, para que ela se justifique.

E, ao longo da história humana, toda a vez que se vendeu uma proposta em que todos saíam ganhando é porque alguém, normalmente o andar de baixo, se lascou retumbantemente.

Para dar uma ajudinha aos colegas e a quem mais tiver interesse (e paciência, muita paciência) para o assunto, produzimos na Repórter Brasil, com a ajuda da Fundação Heinrich Boll, a cartilha “O Lado B da Economia Verde – Roteiro para uma cobertura jornalística crítica da Rio+20?, mostrando como esse mecanismos têm sido aplicados e fazendo uma análise sobre o ambientalismo de mercado (adoro essa expressão). Discorremos sobre a teoria e discutimos casos polêmicos, na tentativa de mostrar outros tons de verde. Algumas informações deste post forma tiradas da cartilha, inclusive.

Dessa forma, incitando o debate, a busca por soluções deixa de ser  monocromático e se aproxima da realidade, que é mais complexa do que parece.

Para baixar a cartilha, clique aqui.

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