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publicado dia 2 de julho de 2012

Antes rivais, videogames se tornam aliados das aulas de educação física

Por Jão Coscelli, do Estadão

Professores adotam jogos para ajudar alunos a conhecer novos esportes e driblar falta de recursos.

“Pessoal, hoje vamos trabalhar com o videogame”, diz o professor Daniel Veras a uma turma de 7.ª série da Escola Estadual Oscar Thompson, em São Paulo. É dia de educação física e o aviso quebra a sonolência da primeira aula da manhã. O tema é atletismo e, em poucos minutos, os alunos disparam perguntas sobre o peso do martelo, a distância viajada pelo dardo e recordes.

Tradicionalmente vistos como “rivais” da escola, jogos digitais vêm se popularizando como uma ferramenta para educadores e aliados das aulas de educação física ao ajudar alunos a conhecer novos esportes e, de quebra, driblar a falta de recursos para tratar de alguns conteúdos previstos no currículo escolar. Embora com ressalvas, os benefícios são atestados por cientistas. O trabalho encontra respaldo na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que garante aos professores liberdade didática.

Foi pesquisando métodos para aplicar conteúdos como saltos e arremessos do atletismo que Veras decidiu inovar – sem deixar as atividades em quadra e o conteúdo da apostila em segundo plano. “Se na escola a gente não tem como vivenciar um salto em altura, arranjamos um jeito”, explica. “Os alunos não tinham noção de como funcionavam algumas modalidades e se empolgaram.”

A ideia, esclarece Veras, era “suprir a necessidade de materiais e espaço” para aplicar o conteúdo, previsto na apostila, mas teve mais efeitos positivos. “O comportamento melhorou e percebi os alunos mais confiantes.”

No Colégio Maxwell, escola particular da zona norte paulistana, o professor Marcos Neves também tira proveito da familiaridade dos alunos com videogames para trabalhar modalidades que vão do futebol de rua à capoeira. Os benefícios, segundo ele, vão muito além do aprendizado. “Alunos que antes se recusavam a participar das dinâmicas de exercícios físicos, mas usaram os jogos, mostraram-se mais sociáveis”, observa.

Na escola municipal Raimundo Correia, em São Miguel, na zona leste de São Paulo, o tae-kwon-do foi a porta de entrada dos videogames nas aulas do professor Jorge Júnior. Praticante da arte marcial, ele deu início a um programa cujo conteúdo eram lutas. “Até alunos que não participavam das atividades mostraram maior interesse”, nota. “É algo da cultura juvenil, e se a escola exclui essas tecnologias, fica mais distante dos alunos.”

Linguagem do aluno

A ideia de introduzir games nas aulas se baseia em pesquisas que estudam a cultura como elemento que influencia o comportamento. Como os professores têm liberdade pedagógica, a ideia é trazer elementos da vida dos jovens à escola, explica Mario Nunes, um dos idealizadores do Grupo de Pesquisas em Educação Física Escolar da USP. Ele lembra que a educação física não trata só do movimento, mas também de colocar jovens e crianças em contato com a teoria e os estudos dos exercícios e esportes.

O presidente do Conselho Federal de Educação Física, Jorge Steinhilber, concorda. “A educação física é confundida com condicionamento e prática de exercícios físicos”, diz, explicando que a disciplina não é uma iniciação esportiva, e sim uma “oportunidade para o aluno vivenciar e compreender modalidades. A ferramenta usada vai de acordo com as possibilidades da escola, da comunidade e do professor”.

Nunes, porém, alerta: “Os jogos não devem servir apenas como atrativo, e sim conservar o objetivo pedagógico, de debater e ensinar. Inserir um elemento desses no currículo não traz mudança se tiver apenas o objetivo de divertir os alunos”.

‘Chocolate com brócolis.’

Os alunos não podem pensar na escola como um local apenas de diversão, concorda a professora Angela McFarlane, da Universidade de Bristol (Grã-Bretanha), autora do livro Use of Computer and Videogames in the Classroom (O uso de computadores e videogames na sala de aula, em tradução livre).

Apesar de ser favorável à introdução de ferramentas tecnológicas na educação, ela lembra que o aprendizado deve ser satisfatório – e não apenas divertido. “Aprender demanda tempo, concentração. É um processo que pode ser difícil, mas é como uma recompensa. O ideal é que a criança se sinta satisfeita com o que aprendeu e reconheça isso como algo relevante”, analisa.

Como jogar é divertido – e aprender, nem sempre -, ela compara esse aspecto à “psicologia do brócolis com chocolate”: se cobrirmos brócolis com chocolate a criança vai comer? Não, porque é ruim. Da mesma forma, os games atraem atenção e concentração das crianças – mas, se mal utilizados, podem não provocar um aprendizado satisfatório, sem resultados efetivos.

Apesar das ressalvas, Angela concorda que jogos e computadores são aliados da educação. No quesito interatividade, ela crê que “não há nada como um videogame” e diz que há evidências de que alguns jogos desenvolvem determinadas habilidades e a capacidade das crianças de resolver problemas.

Mas a professora acredita que o aprendizado é maior quando os alunos são criadores de conteúdos digitais, e não apenas consumidores. “O ideal é envolver os alunos no processo de criação, pois isso os ajuda a explicar sua própria compreensão do mundo e usar isso como meio para compartilhar suas ideias.”

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