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publicado dia 10 de setembro de 2013

Uma escola onde todos são iguais

É hora de começar a semana, mais uma segunda-feira na escola. Sentados em roda, cerca de 20 estudantes e professores aguardam o início da assembleia e definem a pauta numa lousa, enquanto a mesa, responsável por organizar e encaminhar a reunião, é formada por um educador e uma jovem estudante. Esse momento diz muito sobre a Politeia, uma escola democrática de ensino Fundamental localizada no bairro de Perdizes, zona oeste da cidade de São Paulo.

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A assembleia discute temas pertinentes ao dia a dia escolar, que vão desde os grupos de pesquisa, passando pelas saídas do espaço escolar, às regras de convivência que todos terão de respeitar – como, por exemplo, o que pode ou não ser visto na internet. Todos têm voz e voto e apropriam-se de fato de seus direitos, colocando-se publicamente. Os mais jovens (por volta de 6 anos) também expõem argumentos, mas aos poucos, vão trocando a discussão política pelo brincar. Afinal, são crianças.

Percursos

“O grande desafio é despertar o interesse deles pelo conhecimento. O processo de alfabetização, por exemplo, deve partir de uma necessidade que eles sintam de aprender a ler e escrever. E tudo isso é permeado pelo brincar. A criança aqui não irá repetir os padrões de uma escola normal. E os pais geralmente entendem e apoiam essa escolha”, conta Yvan Dourado, professor-tutor da Politeia.

O conceito de sala, aula e prova, inexiste. Os estudantes são agrupados em ciclos (do I ao III, de acordo com as idades) e desenvolvem temas de pesquisa individuais e coletivos, elaborados a partir de seus próprios interesses e do que acontece no mundo. Neste semestre, muitos estão interessados nas manifestações, na questão do transporte público e na tática black bloc. No ano passado, estudaram coletivamente a questão da terra e do território, que serviu de linha mestra para as matérias, todas com o mesmo peso.

“Partindo da terra, podemos estudar o meio ambiente, os conflitos agrários, o clima. Cada área do conhecimento tem uma intersecção possível. Antes eles estavam interessados em mitologia greco-romana. Então fizemos encenações teatrais, história,  trabalhamos nas artes plásticas e isso chegou até os orixás, que foi um bom ponto para começarmos a estudar história da África”, relata o educador Osvaldo de Souza.

Transição

Com 14 anos, Joyce Dória está concluindo os estudos na Politeia, após um percurso de quatro anos que começou com a saída da escola particular que estudava, na zona norte da capital paulista. A transição foi um “alívio”, segundo ela. “Era uma escola muito tradicional, a diretora mandava em tudo, ninguém me escutava. Aqui é totalmente diferente”, afirma a estudante.

A jovem, que hoje pesquisa as manifestações ocorridas em junho, revela que no espaço da Politeia perdeu a timidez e aprendeu a falar em público. “No começo aqui, sempre que eu ouvia um ‘não’, ficava revoltada, brava, mas aprendi a conviver e me ver como parte disso, porque eu também ajudo a construir as regras”, diz Joyce, que também destaca que, na nova escola, os principais aprendizados foram “autonomia e responsabilidade”.

A transição foi acompanhada por seu irmão, que tem Síndrome de Down. Segundo ela, ele costumava sofrer muito preconceito na escola antiga, o que a enfurecia, mas hoje em dia não há qualquer motivo para isso. “Aqui não trabalhamos com o conceito de inclusão, porque ele já parte dizendo que alguém foi excluído. Todos têm suas dificuldades e suas habilidades”, pondera o educador Yvan.

À casa torna

Em sua curta caminhada, um caso marcou bastante o experimento da Politeia. Um ex-estudante, o primeiro a se formar na escola democrática, teve que encarar a tarefa de se adaptar a um colégio tradicional. Ao tentar passar na prova de admissão, se deparou com dificuldades. Ao retornar à Politeia, armou um roteiro de estudos e em pouco tempo havia dominado os conhecimentos necessários para se integrar à nova etapa de sua vida.

Hoje, ele retorna regularmente para a antiga escola para ajudar os formandos, coordenando um Grupo de Estudos especialmente voltado para isso. Serão sete neste ano que devem se preparar para as provas que virão.

“Nós queremos que os estudantes conquistem os instrumentos para que possam ser o que quiserem”, reflete Yvan, ao lembrar-se deste caso. “Essa história confirmou uma hipótese que tínhamos ao fundar essa escola: de que é possível preparar um sujeito, ao dotá-lo de liberdade e habilidades, para que ele seja participativo, solidário e questionador”, reflete.

Como funciona a educação democrática na Politeia

Fórum de Resolução de Conflitos: Quando há algum conflito, o estudante ou o professor escreve em um papel quem são os envolvidos e afixa em um painel. Em seguida, há uma reunião entre as partes conflitantes e dois mediadores, um estudante e um educador. Não há advertência ou suspensões e as questões costumam ser resolvidas no diálogo.

Conselho: Uma vez a cada dois meses, os pais se reúnem com os filhos e a equipe da escola para discutir as questões escolares. Planilhas de gasto da escola são abertas e todos tem voz e voto igual. Inclusive os alunos.

Professor, tutor ou educador? “O papel do professor é importante, mas ele não é o detentor do conhecimento. Aulas expositivas não são encorajadas, mas ele tem que preparar fichas, materiais. Preferimos diálogos, rodas, pesquisas”, afirma Osvaldo, que lembra que os novos educadores passam pelo crivo dos alunos para serem contratados. “O novo professor tem que fazer uma atividade e os estudantes vão escolher o contratado”.

Provar o quê? “Prova machuca, dá medo, deixa o estudante nervoso”, relata Joyce, 14. Na Politeia, os estudantes passam por uma autoavaliação sem nota, além de um acompanhamento dos educadores sobre seu desempenho, em constante diálogo com os pais. “A prova é uma fotografia. Nós olhamos o processo como um todo, em ciclos”, afirma o educador Osvaldo.



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