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Por Fabíola Munhoz, do Educação e Participação

O Prêmio Itaú-Unicef, criado em 1995, como indutor de políticas de educação integral implementadas por ONGs de todo o Brasil, foi só o começo. Hoje, o Cenpec também coordena a efetivação de programas governamentais de educação integral e a elaboração de publicações sobre o assunto.

A coordenadora do núcleo de Educação Integral do Cenpec, Maria Estela Bergamin, vem acompanhando de perto esse trabalho. A educadora concedeu ao site uma entrevista exclusiva, em que define o atual conceito de educação integral, em processo de construção desde o surgimento da ideia, em 1938, e fala sobre avanços e desafios na implantação desse modelo no Brasil.

“A criança pode ter uma parte do aprendizado na escola, e depois outras atividades educativas em outros espaços. Essa composição, com essas oportunidades dentro e fora da escola, é o que a gente está chamando de educação integral, não só em relação a mais tempo de oportunidade de aprendizagem, mas também para que a criança possa aprender sobre outras áreas do conhecimento, que só cinco horas de aula não dariam condição de desenvolver”, define Maria Estela.

Confira a conversa completa a seguir.

Recentemente, o Cenpec e Fundação Itaú Social firmaram uma parceria com as Secretarias de Educação do Estado de Goiás e dos municípios de Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Maringá, para assessorar o desenvolvimento de programas de educação integral. De onde partiu essa iniciativa?
Maria Estela Bergamin –
Nos últimos cinco anos, houve um incremento muito grande dos programas de educação integral no Brasil, estimulados especialmente pelo governo federal através do programa Mais Educação. Então, vem-se conseguindo um número cada vez maior de escolas, que fazem adesão à jornada ampliada dos estudantes. O programa começou a atender 1308 escolas em 2008, em 2011, já contava com cerca de 15 mil, e para 2012 a perspectiva é de que 30 mil escolas sejam atendidas.  Então, a educação integral já não é só uma ideia, um conceito, ela vem sendo concretizada através de programas. Essa é uma realidade de contexto.

Esse trabalho com os municípios e com o Estado de Goiás foi uma demanda deles. Esses governos estão implementando programas de educação integral em seus territórios. Então, pediram uma ajuda e foi feita uma parceria entre a Fundação Itaú Social, o Cenpec e as Secretarias Municipal de Maringá, de BH, do RJ e do Estado de Goiás, para que a gente faça uma assessoria, uma ajuda no desenvolvimento dos programas de educação integral criados por eles.

A ideia da educação integral é que haja conexão entre ONGs, escolas e secretarias de educação. É um desafio estabelecer essa aproximação com o poder público?
Maria Estela –
No macrossistema, o que acontece é uma parceria entre uma secretaria estadual, uma fundação empresarial e o Cenpec. Já temos trabalhado com várias Secretarias de Educação a partir desse triângulo, e é isso que institui o programa. Não temos encontrado nenhum problema nessa triangulação porque as três instituições têm um objetivo comum, que é melhorar o aprendizado das crianças. A fundação empresarial Itaú Social financia o programa, o Cenpec, que é uma ONG, entra com a parte pedagógica, educacional, e as secretarias são os demandantes do trabalho. Eles já têm o projeto de educação integral e nós ajudamos a melhorar, a aperfeiçoar, tornar mais eficiente, a formar os profissionais para atuar com a educação integral.

É recente o interesse dos governos por aplicar a educação integral?
Maria Estela –
A ideia da educação integral é antiga. Desde 1938, o Manifesto dos Pioneiros já dizia que não se pode trabalhar só no período cognitivo porque é preciso usar outras linguagens. As coisas não são separadas, só a aprendizagem intelectual não funciona. Você precisa ter outros tipos de aprendizagem. No Brasil, houve alguns experimentos, como os CIEPs (Centros Integrados de Educação Pública) no Rio de Janeiro, e outras coisas isoladas. Contudo, essa adesão maciça à ideia vem de uns cinco anos para cá, principalmente depois da criação do programa Mais Educação, do governo federal, que é de 2007, e vem estimulando os municípios a ampliarem a jornada.

A educação integral muitas vezes é compreendida como o simples aumento da carga horária dos estudantes. Qual o significado mais amplo desse conceito?
Maria Estela –
A compreensão da educação integral como sendo apenas a ampliação do tempo escolar é insuficiente porque, além de aumentar o tempo, você tem que saber como qualificar esse tempo. Então, o conceito, a ideia de educação integral abrange outras formas de aprendizagem, utilizando diferentes linguagens e as oportunidades do território.

Uma ideia de educação integral muito forte é que a gente tem que admitir a incompletude de cada uma das instituições sozinha. A escola não dá conta de tudo, então a criança pode participar de um programa do governo federal no segundo tempo, pode ir a uma ONG, ao SESI, ou a outro programa social. Juntando todas essas oportunidades do território, você tem a educação integral. Por isso mesmo, esse conceito pressupõe a intersetorialidade. Se você está num território muito pobre, para que haja uma educação integral, talvez só a escola não seja suficiente. Você tem que entrar com a questão da assistência social, da saúde, um programa de cultura, um programa para os pais, para que então tudo isso mobilize a aprendizagem da criança.

Como deve se dar a formação dos educadores para que coloquem em prática esse modelo de educação integral?
Maria Estela –
O Cenpec trabalha de maneira geral, não só nos programas de educação integral, com uma linha de formação que se baseia na participação, na autonomia e no uso da criatividade do estudante. Então, a gente também tem que aplicar esses princípios na formação de educadores.

Qual o maior desafio para efetivar a política de educação integral em diversos territórios?
Maria Estela – Na verdade, a dificuldade é estrutural, dos contextos dos territórios. É difícil para a realidade das escolas, dos territórios, organizar esse período ampliado, porque às vezes a unidade educacional não tem professor ou educador para isso. Em alguns casos, o professor não se interessa por dar duas aulas a mais à tarde, dentro de um programa de educação integral, se pode dar aula de manhã numa escola e à tarde em outra, ganhando um período a mais de remuneração. Então, os municípios e as escolas ainda estão lidando com a dificuldade de arranjar educadores que topem fazer esse trabalho. Outro desafio é a falta de preparo dos profissionais para realizar esse tipo de trabalho.

O trabalho com oficinas e projetos, por exemplo, ainda é uma novidade para os educadores. Propomos atividades de vivência, em que o estudante aprenda de um jeito diferente, não só copiando da lousa, ou fazendo exercício. E isso é difícil para a estrutura da escola, para os professores, porque foge ao modelo clássico. É uma proposta que também exige que as crianças almocem na escola, e isso precisa de toda uma infraestrutura. Além disso, muitas escolas não têm espaço físico, então necessitam transporte para levar os estudantes para fazer atividade numa quadra, ou na sala de uma ONG, por exemplo. Então são coisas que ainda estão começando no Brasil. Você não tem uma estrutura pronta.

Quando formamos os educadores, buscamos acolher essas dificuldades trazidas para as oficinas. As condições nas escolas, nos territórios e nas ONGs são muito precárias para o que a gente realmente gostaria de fazer e nós temos que lidar com essa pauta, com essa realidade dura dos territórios. Além disso, essas atividades são oferecidas aos alunos que vivem em situação de vulnerabilidade social, e as escolas que oferecem essas atividades estão geralmente localizadas em regiões onde realidade é muito dura. Então, quando você faz a formação, você tem que pensar: dentro dessa realidade, o que nós podemos fazer?

Qual a idade dos estudantes que recebem a educação integral a partir de programas como esse?
Maria Estela – A maior parte dos programas de educação de integral ainda atende crianças de até 12 anos, do 1º ao 5º ano do ensino fundamental. Para assegurar, ou oferecer oportunidades para adolescente é bem mais difícil porque eles estão numa idade mais especial. Com eles, também é preciso abordar o tema das novas tecnologias, meios mais modernos de aprendizagem, materiais multimídia, muita circulação pelo território, projetos comunitários, etc.

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