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publicado dia 2 de agosto de 2013

Especialistas discutem mudanças na progressão continuada em São Paulo

O jornal Folha de S. Paulo revelou, no início desta semana (29/7), que o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, pretende reorganizar os ciclos escolares e os currículos da rede municipal de ensino.

[stextbox id=”alert” caption=”O que é progressão continuada” float=”true”]A progressão continuada parte da ideia de que os estudantes não têm que ser avaliados em séries, deslocados de suas turmas e universos afetivos com repetências. A avaliação deveria acontecer em ciclos e com constante acompanhamento e reforço para sanar as defasagens individuais. Frequentemente confundida com aprovação automática, a progressão continuada é prevista pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação, mas só é aplicada em todos os níveis de ensino no estado de São Paulo e é vista como uma medida efetiva na diminuição da evasão escolar.[/stextbox]

Segundo o jornal, um documento foi enviado pela Secretaria Municipal de Educação aos dirigentes da rede para discussão das reformas no ensino fundamental, que incluem mudanças na progressão continuada e no sistema de avaliação dos estudantes. Como a proposta ainda é uma minuta, podem haver mudanças no texto até a sua apresentação oficial, prevista para o final de agosto.

Atualmente, o ensino fundamental na rede pública municipal é dividido em dois ciclos. O primeiro termina na 5ª série, enquanto o segundo vai até o 9º ano – apenas no fim de cada um desses ciclos existe a possibilidade de reprovação do estudante. Com a nova proposta, o período passaria a ser dividido em três ciclos, que terminariam no 3º, no 6º e no 9º anos (todos com possibilidade de reprovação). Além disso, a retenção poderia acontecer durante todo o último ciclo, ou seja, também nas 7ª e 8ª séries.

Menos reprovação em SP

Há muita discussão em torno da maneira ideal de avaliar os estudantes e acerca dos critérios de aprovação e reprovação. A professora do Departamento de Educação da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Márcia Jacomini, acredita que existe uma falsa crença de que a reprovação produz mais disciplina, alunos interessados e, consequentemente, uma melhor aprendizagem. “Temos um histórico do uso da reprovação inclusive como um instrumento de pressão. Nós ainda somos um dos países do mundo que mais reprova”, observa a professora.

Dados do Censo Escolar de 2011, fornecidos pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), revelam que o estado de São Paulo tem uma das menores taxas de reprovação estudantil no ensino fundamental. Apenas 4,9% dos estudantes paulistas são reprovados. São Paulo está à frente apenas do Mato Grosso, que reprova 3,6% dos alunos. De acordo com a pesquisa, a média nacional de reprovação no ensino fundamental é de 9,6%.

O Censo Escolar de 2006 mostra que São Paulo é a única federação do país com 100% de escolas públicas (estaduais e municipais) que adotam o regime de ciclos e progressão continuada; no Mato Grosso, 74% possuem o mesmo sistema. Não se trata de coincidência serem esses os estados que menos reprovam seus alunos.

Para o coordenador do Observatório da Juventude da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Juarez Dayrell, a ideia da progressão continuada é correta, mas para funcionar em termos pedagógicos, a avaliação não pode ser punitiva, e sim diagnóstica. “Como pensar em uma avaliação que, ao invés de punir, estimule o aluno a superar seus próprios limites?”, questiona. “Cabe ao professor equacionar e descobrir formas de como resolver os problemas que o aluno apresenta. E não puni-lo por não saber”, avalia o coordenador.

Aprovação automática

“A discussão não deve girar em torno do ciclo e da progressão continuada, mas sim do que fazemos durante o ciclo e como usamos a progressão continuada, pois ela virou uma progressão automática”. Essa é a opinião de Inês Miskalo, coordenadora da área de Educação Formal do Instituto Ayrton Senna. Para ela, a progressão continuada deixa de levar em conta a preparação do aluno, pois este automaticamente vai para o ano seguinte.

Miskalo avalia que a ideia da redução dos ciclos é interessante para reduzir o tempo que o estudante fica “esquecido” na escola. Ela afirma que é impossível corrigir os problemas acumulados e apresentados pelo aluno quando são trabalhados apenas no final do ciclo. “É preciso olhar o aluno direta, sistemática e rotineiramente o ano inteiro. Todos os meses, semanas, dias, e saber onde ele parou para identificar qual o problema que veio a estancar seu processo de aprendizagem. Tudo isso para o professor poder interferir na hora certa”, aponta Miskalo.

O acompanhamento diário dos estudantes é essencial para desenvolver medidas que solucionem os problemas de aprendizagem dos alunos. “Nesse ciclo, o fato de haver três ou cinco anos possíveis para repetição torna-se um fator menor se você cria mecanismos mais eficazes de acompanhamento”, argumenta Dayrell.

Porém, ele mesmo sabe que as condições existentes na educação brasileira dificultam a realização do acompanhamento escolar. “É muito difícil para um professor, com a condição docente que a gente conhece hoje, fazer um acompanhamento individualizado dos alunos, o que seria o correto”.

Dependência e exames

A mudança na rede municipal prevê ainda que, durante o terceiro ciclo, os estudantes poderão acumular dependências de séries anteriores – como acontece no ensino universitário. Isso significa que, caso o aluno não tenha bom desempenho em um dos conteúdos, seguirá no ano seguinte com acompanhamento específico.

Para Jacomini, no entanto, a possibilidade de o aluno obter dependências segue sem responder à questão da falta de reforço e recuperação escolar. “O que aconteceu que o aluno conseguiu ir bem em tudo, mas não se fez uma intervenção no momento em que se decide pela reprovação naquela matéria?”, questiona.

O documento enviado à Secretaria também aponta a obrigatoriedade da aplicação de dois exames semestrais, com a proposta de que as notas sejam enviadas às famílias do estudante. Atualmente, cabe a cada escola definir quantas avaliações serão feitas.

Jacomini avalia que, ao interferir diretamente no trabalho do docente, as instâncias intermediárias entre Estado e escola evidenciam um descrédito e desconfiança em relação ao trabalho dos professores. “O docente sabe que precisa fazer a avaliação. E ele, mais do que ninguém, sabe o momento certo de aplicar a prova”, afirma.

Analfabetismo

Ainda entre as mudanças propostas pelo documento está a meta de alfabetização dos alunos. Seguindo um modelo proposto pelo governo federal através do Pacto Nacional para Alfabetização na Idade Certa (PNAIC), a Prefeitura de São Paulo estipulou alfabetizar seus estudantes até os oito anos – diferentemente da proposta do governo estadual, que traçou sua meta de alfabetização até os sete anos.

“A questão da idade não é onde a gente precisa se deter, mas sim em como vai acontecer essa alfabetização. Se uma criança mudar de uma rede para outra [municipal e estadual], como isso pode impactar na vida dela? Será que o município e o estado vão conversar entre si?”, pontua Miskalo.

Pesquisa realizada pelo Instituto Paulo Montenegro mostrou que a taxa de analfabetos funcionais no Brasil caiu de 39% em 2002 para 27% em 2012. Entretanto, segundo Miskalo, ainda é possível observar a chegada de muitos jovens que não foram plenamente alfabetizados ao 9º ano do fundamental e ao ensino médio. “Muitas vezes a criança não aprende porque não teve oportunidade em função da própria forma como foi desenvolvido o processo de ensino, e não por uma questão dela”, conclui Jacomini.

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