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publicado dia 24 de setembro de 2013

Em Ubatuba, educação contribui para o resgate de culturas tradicionais

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“Eu não quero pescar peixe pra vender em restaurante ou em pousada. Eu quero é pescar peixe e ajudar a desenvolver minha comunidade.”

A afirmação é de Zé Pedro, neto de escravos angolanos e um dos líderes do Quilombo da Fazenda, localizado em Ubatuba, município do litoral norte de São Paulo. Zé Pedro fundou na última semana, em parceria com a prefeitura da cidade, a Cooperativa do Azul, que dedica-se a atividades como o turismo rural e a produção de farinha de mandioca. “Queremos resgatar as culturas tradicionais pra receber vocês [turistas], de coração, com as coisas da gente”, diz o líder quilombola.

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No domingo (22/9), Zé Pedro esteve presente, assim como o prefeito de Ubatuba, Maurício Moromizato (PT), na mesa intitulada “Democracia, Políticas Públicas e Extensão Universitária” do XI Colóquio de Psicopatologia e Saúde Pública, promovido pelo Nupsi (Núcleo de Psicopatologia, Políticas Públicas de Saúde Mental e Ações Comunicativas em Saúde Pública) em parceria com a USP (Universidade de São Paulo).

O evento, que ocorreu na capital paulista sob o tema Invenções democráticas: construções da felicidade, ainda teve a participação de Helena Singer, socióloga e diretora pedagógica da Cidade Escola Aprendiz, e Elie Ghanem, professor da Faculdade de Educação da USP.

Participantes discutem a importância da criação de territórios educativos

Cooperativa do Azul

O prefeito de Ubatuba considera Zé Pedro um “patrimônio da cidade”. Ele fez questão de ressaltar a diversidade cultural do município litorâneo – baseado em culturas tradicionais dos caiçaras, quilombolas e indígenas –, mas lembrou também que a riqueza territorial é ocupada por gente que não frequenta a cidade. “Precisamos de um governo que não seja pautado pelo modelo de desenvolvimento do Estado e da União”, salientou Moromizato.

Dos 60 mil domicílios da cidade, 50% são de uso ocasional devido às características veranistas de Ubatuba, que também influi na enorme quantidade de empregos informais. Segundo o prefeito, as ocupações tradicionais foram expulsas por essas residências. “Condomínios fechados ocupam praias, enquanto os loteamentos irregulares de baixa renda ocupam os sertões, as margens de rio e as encostas, consideradas áreas de risco”, definiu o prefeito.

É nesse contexto que surge a Cooperativa do Azul, que recebeu esse nome devido ao prato tradicional caiçara que leva peixe e bananas verdes; ao cozinhá-las, forma-se um líquido azul marinho. Zé Pedro lembra que, com a chegada do turismo às áreas das comunidades tradicionais, foi necessário criar associações para proteger os interesses locais.

“As coisas estão melhorando com a Cooperativa do Azul, baseada nas festas, nas danças, nas comidas típicas caseiras. Para receber nossos turistas, temos que mostrar coisas nossas”, finalizou Zé Pedro, ovacionado pelas cerca de 100 pessoas presentes no debate.

Espalhar a educação

Helena Singer usou a Cooperativa como exemplo ao afirmar que, se a escola não é a única a garantir processos de desenvolvimento integral, é necessário espalhar a educação pelo território. “É preciso que as igrejas, clubes, teatros, pontos de cultura desenvolvam processos educativos assim como o quilombo do Zé Pedro”, declarou a socióloga.

Para ela, a escola é gerida de maneira a não deixar que a interdisciplinaridade aconteça. Isso significa que a diversidade educativa, um dos princípios da educação integral – que pretende abarcar conceitos de direitos humanos, política, cultura, comunicação, meio ambiente, cidade, esporte, urbanismo, entre outros – é deixada de lado pela maioria das instituições de ensino. “Desse modo, as crianças ficam presas na escola”, arrematou Singer.

A tradição de forte isolamento dessas instituições foi discutida pelo educador Elie Ghanem. Para ele, a escola foi montada para ser estranha a seu ambiente externo, e a ideia clássica de que ela vai transmitir os conhecimentos de forma homogênea não passa de ilusão. “Elas são muito mais concebidas como lugares de transmissão de conhecimentos do que de produção deles”, afirmou.

Ghanem integra a organização do Seminário Educação como Desenvolvimento Local, ocorrido no início de setembro, e propôs soluções para os problemas da zona leste de São Paulo. Segundo ele, há apenas duas instituições de ensino superior públicas na região – a USP Leste e uma escola técnica. Para um universo de quase quatro milhões de habitantes da zona mais populosa da capital, apenas sete mil pessoas frequentam cursos universitários públicos. “Precisamos ampliar as oportunidades”, defendeu.

Mudança cultural

Maurício Moromizato voltou a utilizar o exemplo da cidade que administra para destacar o papel transformador da educação. “O que a Cooperativa do Azul mostra é que precisamos de uma sociedade que saiba distinguir o que é bom para ela. E aí temos a questão da educação como fator essencial para essa mudança cultural.”

Em relação às políticas públicas, Singer criticou as secretarias de Educação, “fechadas como as escolas”. Para ela, a pasta poderia ser a catalisadora de um desenvolvimento municipal, já que ela possui um orçamento elevado se comparado às outras secretarias. “Uma política municipal que se estrutura através da educação tem muitas condições de dar certo, mas aí temos que superar o corporativismo”, pontuou.

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