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publicado dia 10 de setembro de 2014

Da internet à escola, bullying expõe dramas da infância contemporânea

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Publicado originalmente no Promenino

“Eu sofro bullying desde que eu consigo me lembrar.”
“Por anos, fui perseguido na escola, ainda não sei explicar a razão.”

“Diziam que eu nunca chegaria a lugar algum e não seria ninguém.”
“Eu ouvia tanto isso que passei a acreditar.”

As frases acima são ditas com frequência por crianças e adolescentes que sofrem violência física e verbal de forma sistemática, normalmente na escola ou na internet. Seja pela aparência, por questões de gênero ou pelo simples fato de agir de maneira diferente dos padrões impostos pela sociedade, os motivos nunca parecem justificáveis. Trata-se do bullying (algo como “intimidação”, em inglês), e suas consequências podem gerar traumas e até levar ao suicídio. Segundo especialistas, a culpa pode ser dos adultos.

Um estudo sobre bullying realizado pela ONG Plan, em parceria com o Centro de Empreendedorismo Social e Administração em Terceiro Setor (Ceats), aponta que, em 2010, cerca de 70% dos alunos brasileiros presenciaram algum colega ser maltratado ao menos uma vez na escola. Na Região Sudeste, o índice chega a 81%. A pesquisa foi feita com 25 escolas em todo o país e ouviu alunos de 10 a 15 anos de idade.

Quais as causas dos maus-tratos?

De acordo com a pesquisa da Plan, para a pergunta “por que você acha que alguns colegas maltratam outros?” as respostas mais frequentes dadas pelos alunos foram, em sequência: “porque querem ser populares, “não sei dizer”, “por brincadeira” e “querem dominar o grupo”. Os resultados revelam que “os maus-tratos entre colegas no ambiente escolar podem ocorrer porque o agressor é mais forte do que a vítima, a vítima não reage, a vítima é diferente, os agressores não são punidos pela escola, sentem-se provocados e acham que as vítimas merecem.”

Para a psicóloga Rosely Sayão, a violência é crescente em todas as idades, mas a infância e adolescência precisam de mais atenção. “Estamos vivendo um momento social em que é preciso ser jovem e feliz a qualquer custo. Os adultos têm prioridade absoluta em si mesmos e estão ignorando cada vez mais suas responsabilidades”, afirma. “A ideia de infância tem desaparecido. Estamos tratando as crianças como adultos e ignorando suas necessidades.”

Violência na escola…

Impaciência, intolerância e agressões. Dentro da sala de aula, esse comportamento, quando replicado, “é um respaldo do que a criança vive”, conforme aponta a supervisora de ensino Vanda Cronemberger, da Unidade Escolar Cipriano Vieira de Sá, no Piauí. “A responsabilidade dos pais é bem grande. Quando visitamos ou recebemos algumas famílias, notamos que dentro de casa falta educação, respeito e atenção. A criança é o reflexo disso. O comportamento dos filhos depende dos pais e da sociedade”, avalia.

De acordo com Vanda, há um ciclo de violência geracional, a criança convive com a violência na família, na escola e nas mídias (como TV e internet). Quando ela cresce em um ambiente hostil, continuará reproduzindo a agressividade. “Trabalhamos muito com essa questão em sala de aula. Nossos educadores vêm de uma longa caminhada em Direitos Humanos, mas percebemos que, de forma geral, muitos profissionais não têm formação necessária para lidar com situações de violência”, explica.

… e na internet

A pesquisa “Este Jovem Brasileiro”, realizada anualmente pelo Portal Educacional, mostra que as ofensas que começam na escola podem ir também para a internet e vice-versa. Ao entrevistar mais de 4 mil adolescentes, 300 pais e 60 profissionais da educação de 36 escolas, o estudo aponta que, diferentemente dos pais, os professores parecem perceber melhor os problemas sofridos pelas crianças e adolescentes no mundo virtual. Enquanto apenas 16% dos pais dizem que os filhos já tiveram problemas de bullying ou ofensas na internet, quase 64% dos professores detectaram casos entre os alunos. Ao todo, 73% também notaram conflitos em sala de aula causados por conteúdos publicados em redes sociais.

Para Rosely Sayão, a internet não é a vilã, mas os créditos pelo comportamento ofensivo são, novamente, dos adultos. “Se você parar para observar os comentários que os adultos fazem em qualquer tipo de conteúdo na internet, vai perceber que são violentos, jocosos, humilhantes. Se os jovens e adultos fazem isso, por que não as crianças e adolescentes?”, questiona.

A pesquisa aponta, ainda, que 23% dos adolescentes dizem já terem sido vítimas de insulto ou violência pela internet. Além disso, 16% já sofreram algum tipo de preconceito e 36% já ficaram tristes por problemas vividos no mundo virtual. A maioria dos estudantes concorda que a web facilita agressões, preconceitos e mentiras. Outros 37% disseram já ter agredido/ofendido alguém pela internet.

“Esta mensagem pode ser ofensiva”

A Comissão de Educação da Câmara de Deputados aprovou, em julho deste ano, o Projeto de Lei 6504/13, proposta que obriga as escolas brasileiras a realizarem campanha contra o bullying. As ações devem ser anuais em todas as escolas de ensino fundamental e médio, com duração de uma semana, sempre na primeira quinzena de abril.

Em Pajeú do Piauí, pequena região do semiárido piauiense, com apenas 3.363 habitantes, a escola Cipriano Vieira de Sá, da supervisora Vanda Cronemberge, já se adiantou. Com o projeto “Conte até 10 nas Escolas”, do Conselho Nacional do Ministério Público, a unidade escolar mostrou aos alunos, professores e colaboradores, por meio de oficinas lúdicas, as diversas formas de bullying e seus males na vida de crianças e adolescentes. “Essas campanhas devem ser obrigatórias, sim. Precisamos amenizar todo tipo de violência e valorizar mais a tolerância e a diversidade”, aponta Vanda.

As ações aconteceram em maio e junho. Todos os funcionários foram mobilizados para participar de aulas temáticas, programa de rádio na escola, peças de teatro, divulgação de panfletos e seminário aberto à comunidade. “Percebemos uma mudança de comportamento e também mais atenção dos educadores. A agressividade entre os alunos diminuiu bastante, há mais consciência também frente à situação de pressão e frustração”.

Outro exemplo positivo vem de uma estudante norte-americana de apenas 13 anos. Trisha Prabh criou o “Rethink” (do inglês “repense”), um software para reduzir o bullying na internet, principalmente em redes sociais.

Diferentemente de outras iniciativas que tentam bloquear o conteúdo postado, o Rethink, como o próprio nome afirma, sugere que a pessoa repense sua postagem na internet com o alerta: “Esta mensagem pode ser ofensiva. Você gostaria de revisar e repensar antes de postar?”.

O projeto foi um dos 15 escolhidos pela Feira de Ciências do Google deste ano. Pela pesquisa desenvolvida por Trisha na escola onde estuda, dos 750 testes aplicados aos estudantes, 93% deles decidiram não postar a mensagem ofensiva após a oportunidade de parar para ler novamente e repensar a publicação.

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