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publicado dia 18 de setembro de 2014

Rosa María Torres: “Há um descompasso entre as diretrizes curriculares nacionais e o PNE”

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Por Ana Luiza Basílio, do Centro de Referências em Educação Integral.

A opinião é da pedagoga e especialista em educação básica, Rosa María Torres que, na manhã da última terça (16/9), se reuniu com a equipe de jornalismo e parceiros do Portal Aprendiz e Centro de Referências em Educação Integral. Convidada a debater o cenário educacional, Rosa partiu de suas inferências recentes sobre as políticas educacionais brasileiras. “Vejo que as diretrizes curriculares falam de uma reorganização da escola, com seus sujeitos, tempos, espaços, conteúdos e pedagogia; no entanto, essa perspectiva não é refletida pelo Plano Nacional de Educação, organizado sob metas quantitativas que parecem considerar somente o início e fim dos processos”, problematizou.

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Essa descontinuidade, a seu ver, acaba por perpetuar a cultura da avaliação, que tem por prática reduzir pessoas a pontuações. Lógica, segundo ela, perversa e permeada em toda a América Latina. Ainda assim, Rosa María julga fundamental que os países tragam para si os debates sobre seus métodos avaliativos, sob a pena de invalidar todos os demais processos educacionais.

A ex-ministra de educação do Equador entende que, no Brasil,  há um descompasso entre os discursos de defesa de uma educação integral e as políticas e planejamentos atuais. Para ela, é preciso investir em programas que efetivamente sustentem o indivíduo em suas variadas dimensões de desenvolvimento.

Metas de escolarização x metas de educação

Para a especialista, outro ponto importante é se ter clareza do que se entende por metas de escolarização e educação. Nos Estados Unidos, como exemplificou, há uma cultura de educação centrada na escola, garantida pelo esforço das famílias, o que faz do país uma nação escolarizada. No Uruguai, por outro lado, a educação se sustenta por um histórico positivo de escolas públicas, pelo investimento na formação de professores, e também por uma cultura leitora e cultural, que fazem do país um território educado em sua essência.

A cultura, em sua análise, é determinante para que as avaliações externas não façam leituras incorretas, a partir de parâmetros que em nada dizem sobre a realidade local. “A partir do momento que eu avalio uma pessoa pelo Índice de Desenvolvimento de Educação Básica (Ideb), estou dizendo que o processo de aprendizagem não é relevante”, considerou. A educadora também condenou o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) que, para ela, é construído em padrões e sob competências e habilidades diferentes das necessárias aos países latinoamericanos.

Rosa María Torres é colunista do Portal Aprendiz. Acompanhe aqui os artigos.

Rosa María reforçou que os países que participam do exame não partem do mesmo contexto, e questionou: “a cultura latino-americana convida a outras habilidades, como o canto, a música, a oralidade; a relação com o corpo, as danças, sem contar com as habilidades dos jovens que lidam com questões como trabalho e locomoção nas grandes cidades. Todos esses saberes, impressionantes, não contam nas avaliações”, observou.

Para a especialista, as escolas deveriam ter como missão principal descobrir talentos e não apontar, em conjunto com as avaliações, o que os alunos não sabem.

A educação finlandesa, possível aos finlandeses

Foi nesse contexto que Rosa María incorreu sobre a educação da Finlândia, tida como modelo em todo o mundo. A especialista situou a excepcionalidade alcançada no país, que toma como base algumas premissas do próprio Estado, que entende, por exemplo, a educação como assunto de ordem pública – mesmo as escolas privadas recebem financiamento do governo. Em paralelo, citou a boa formação de professores, a valorização de sua carreira e o princípio da equidade em detrimento ao da excelência.

“Não há provas, não há Ideb; o valor da avaliação é dado na própria aula, momento em que o professor faz uso de ferramentas para apoiar a aprendizagem; não há ranking de escolas porque parte-se do entendimento de que toda escola deve ser boa; também não há repetição, porque se entende que se o aluno tem dificuldades é necessário acompanhamento direto com o professor que não vai deixá-lo para trás”, enumerou.

Segundo a especialista, a Finlândia tem um sistema inverso ao que os outros países propõe; o país tem a jornada escolar e o calendário educativo mais curto da Europa e as horas em sala de aula também são reduzidas em prol de recreios maiores. Mas, a escola permanece aberta durante as férias, com atividades recreativas, culturais e de lazer. “As bibliotecas, além de abertas o ano todo, são repletas de atividades, incentivando o acesso e a relação da juventude com os livros”, comenta, lembrando que o país tem a maior população leitora do mundo.

Para Rosa María, é preciso questionar a cultura escolar vigente, afirmando que “não está escrito em nenhum lugar que ela tem que ser a mesma em todos os países”. Para tanto, ela incentiva que como sociedades plurais questionemos o fato da cultura escolar se apresentar de maneira surpreendentemente igual em todo o mundo, independentemente da diversidade cultural do mundo. Em sua leitura, diferente do discurso de alguns organismos internacionais, está instalada uma crise global de ensino, e não de aprendizagem, já que não é culpa do aluno o fracasso dos processos pedagógicos.

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