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publicado dia 11 de maio de 2015

Revista Contravento propõe soluções criativas para as cidades contemporâneas

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São Paulo, 2068. Após a reinauguração de grandes canais hidroviários e a construção de diques, represas, eclusas, portos e hidroindústrias, a capital paulista se torna aquática, dinâmica e pacificada. Os problemas relacionados à água – seja na falta ou no excesso – “não passam de uma lembrança longínqua”.

Uma reviravolta climática, porém, ameaça todo esse progresso: uma cheia histórica paralisa a cidade. “O que dizer dos primeiros homens que há séculos chegaram aqui? Aventureiros e mercenários, eles venceram a Serra do Mar, exterminaram e escravizaram outros homens, esgotaram os recursos naturais, desfiguraram a paisagem para erguer esta cidade. Que, agora, a enchente e a neblina parecem querer apagar…”

ContraventoEsse é o tema da história em quadrinhos que inaugura a sexta edição da revista Contravento. Costurando realidade e ficção através de diversas formas de manifestação artística, a publicação foi lançada em 2003 por estudantes da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) e, sob a temática Cidade x Natureza, pretende “contribuir para a transformação da cidade”, de acordo com um de seus organizadores, Alexandre Benoit, professor da Escola da Cidade. Ele questiona: “o que são as aglomerações humanas perante à natureza, ao planeta e aos recursos naturais?”.

Com foco na relação entre arte e cidades contemporâneas, a revista Contravento reúne textos críticos, entrevistas, histórias em quadrinhos, experimentos gráficos e ensaios de autores brasileiros e estrangeiros. Tem a intenção de compor um campo de debate amplo e plural, formulando análises e proposições criativas para as cidades contemporâneas, e foi premiada pela Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo.

Presente no debate que lançou a revista, realizado na quinta-feira (7/5), na sede paulista do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB-SP), o urbanista Alexandre Delijaicov, coordenador do grupo Metrópole Fluvial e autor de um projeto de hidroanel que torna navegáveis os grandes rios paulistanos, tem boas recordações da esquina onde está o IAB.

“Esse lugar guarda muito das discussões sobre arquitetura no Brasil. Lembro de estar na varanda com Ulisses Costa e Paulo Mendes da Rocha no início da década de 1990 e, da nossa conversa, surgiu o tema do XIII Congresso Brasileiro de Arquitetos Lúcio Costa: arquitetura, cidade e natureza.”

Vinte e cinco anos depois, Alexandre está de volta ao IAB para debater o mesmo assunto. Para ele, a utilização do potencial hídrico é essencial para o desenvolvimento da infraestrutura de um tecido urbano. “No entanto, o que fazemos sistemática e rapidamente é o processo de invadir, lotear e vender o primordial logradouro público de uma natureza urbana: os leitos dos rios”, critica.

Ele diverge de quem acredita que a água está em perigo no sudeste brasileiro apenas porque não chove o suficiente. “Atrelada à completa fragilidade institucional, a crise hídrica que vivemos não se resume a um problema técnico ou hidráulico, mas sim social e político. É uma minoria absoluta que submete a maioria à falta de direito à cidade.”

Cidade sem rios

Autor do livro “Paulo Mendes da Rocha – Obra Completa”, o arquiteto italiano Daniele Pisani frisou que os problemas com a água não são exclusivos do Brasil. “Em Veneza, as grandes enchentes, que danificavam toda a estrutura arquitetônica da cidade, criaram a necessidade de construir um enorme sistema de barragens móveis”, afirma. Nos dias em que o nível da água é mais alto do que o limite pré-estabelecido, as barragens são acionadas para separar a Lagoa de Veneza do mar Adriático.

Praça San Marco, em Veneza: enchentes são constantes na cidade italiana.
Praça San Marco, em Veneza: enchentes são constantes na cidade italiana.

“É uma ideia típica do século 21: resolver qualquer tipo de problema de última hora utilizando a tecnologia. Considero falha, pois poderia ter sido resolvido com pequenas soluções cotidianas”, observa. O italiano vê no planejamento da cidade de São Paulo um “exemplo infinito” de falta de raciocínio em relação às águas. “Aqui elas estão entubadas e esquecidas. Uma cidade não faz sentido sem seus rios.”

No dia 19/5 haverá novo evento de lançamento da sexta edição da revista, na FAU-USP (Rua do Lago, 876, Cidade Universitária), com a presença de Milton Braga, professor de arquitetura e Odete Seabra, docente de geografia.

Para Alexandre, o Brasil possui recursos naturais, humanos, extensão e subsolo que viabilizariam qualquer construção de infraestrutura hídrica, como redes de canais para a locomoção humana na água. “É preciso entender que a nossa casa não se reduz a quatro paredes e um teto. A cidade é a nossa casa”, defende o urbanista, um dos autores do projeto “Praças de Equipamentos Sociais”, de 1992, que originou os Centros Educacionais Unificados (CEUs) alguns anos depois.

“A construção de uma cidade deveria ser aberta para todos saberem como fazê-la. A verdadeira ação da arquitetura é fundamentalmente política”, argumenta. Para ele, ao não ser coletiva, a propriedade da terra vira um cassino. “A especulação nos enxerga como seres descartáveis, estabelecendo a lógica do vencedor e do perdedor. Mas eu ainda acredito que nós podemos inventar o nosso próprio lugar.”

ContraventoPara exemplificar essa ideia, Alexandre cita a luta pela apropriação cultural do espaço público que acontece nos parques Augusta e dos Búfalos – um no centro e outro na periferia paulistana. “São iniciativas corajosas que nos incentivam a construir a cidade como a nossa casa, transformando-se assim em um grande lugar de aprendizado”, conclui.

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