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publicado dia 3 de novembro de 2015

Famílias em torno de uma mesa transformam a cidade de Barcelona

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Por Juliana Sada

Sentar ao redor de uma mesa e passar uma tarde juntos, compartilhando – para além de uma refeição – vivências, histórias e inquietudes. O ritual soa comum: grupos de amigos e famílias costumam vivenciar este tipo de experiência habitualmente. Afinal, as refeições não servem apenas para se alimentar, mas também são espaços de construção de relações socioculturais. Um pouco mais diferente seria se reunir com uma família desconhecida para fazer uma refeição conjuntamente. Como você prepararia a sua casa? O que cozinharia? E se fosse você o convidado? Estaria nervoso? Levaria algo?

Em Barcelona, um projeto realizou esses encontros inusitados e conseguiu envolver mais de 300 pessoas. O objetivo? Estreitar os laços entre vizinhos, fortalecer o tecido social, lidar com o racismo, derrubar estereótipos e construir uma cidade mais diversa e tolerante. “A proposta é fazer o encontro entre duas famílias e numa casa, porque é o espaço mais íntimo para fazer esta aproximação”, aponta Sandra Nafría, técnica do projeto.

Cidade Educadora

Barcelona é conhecida por ser a primeira cidade do mundo a se declarar uma “Cidade Educadora”, apostando nos espaços públicos e na articulação de diferentes setores para garantir a educação integral de suas crianças e adolescentes. Conheça a história completa dessa experiência.

Promovido pela entidade SOS Racisme, em parceria com a prefeitura de Barcelona, o projeto Familia del costad (Família do lado, em catalão) realizou 46 encontros entre 2014 e 2015. Em cada ocasião, duas famílias vizinhas e de origens culturais e étnicas diferentes se reuniam para se conhecer e realizar juntas uma refeição. Como não têm contato até o encontro, voluntários intermedeiam a preparação do encontro e trabalham para que não haja imprevistos. Para o projeto, o conceito de família é amplo: pais solteiros, avós, amigos e casais homo ou heterossexuais poderiam participar da iniciativa.

Para a diretora da SOS Racisme, Alba Cuevas, “faltam espaços de encontro para as famílias. Buscamos dar a oportunidade de se a viver a riqueza da diversidade, que nem sempre podemos compartilhar”.

Além da refeição

À beira do Mediterrâneo, Barcelona vivencia há cerca de quinze anos a chegada de imigrantes de todo o mundo. Argentinos, paquistaneses, peruanos, chineses, senegaleses, brasileiros, entre inúmeras outras nacionalidades, fizeram da cidade um cenário de diversidade, com grande variedade de rostos, culturas e idiomas.

No entanto, essa convivência não significa que haja um entrosamento entre as culturas. “Queremos passar de um modelo de cidade multicultural para um intercultural, para que haja relacionamento entre as diferentes culturas, e não só cada uma em um lugar”, explica Lola López, responsável pelo tema da imigração na prefeitura de Barcelona.

Com o crescimento da migração, também vieram os casos de intolerância e xenofobia e o projeto Família ao Lado foi pensado também para fazer frente a isto. Na avaliação dos mentores do projeto, conhecer o outro é uma eficaz maneira de combater a intolerância. “Se você tem uma relação, há uma cumplicidade e isto ajuda a combater o racismo”, avalia Alba.

Lola ressalta que a proposta do projeto de realizar uma refeição permite expandir o debate acerca da intolerância. “Chegamos a um público que, em geral, não atingiríamos. Como as atividades são se reunir e comer, é mais fácil envolver pessoas que não participariam de um debate sobre racismo.”

A ideia de se sentar ao redor de uma mesa, compartilhar uma refeição e conhecer seus vizinhos foi o que atraiu Montserrat Garcia Vidal e seu marido. “Nos pareceu uma ideia simples e genial.” Após conhecer o projeto por meio do centro recreativo dos filhos, o casal decidiu se inscrever no projeto como família anfitriã. Até o momento em que abriram a porta de casa, não sabiam que receberiam um casal de peruanos e seu filho. “Talvez os primeiros três minutos tenham sido difíceis, mas no 3:01 já estávamos a toda, não paramos de conversar e rir”, relata.

Família ao lado
Montserrat inscreveu a família para ser anfitriã do projeto.

Para evitar que a estranheza dure mais que uns três minutos – e outros possíveis inconvenientes –, cada encontro conta com um acompanhante presente. O voluntário também participa da organização do encontro, por exemplo, combinando horários e conferindo se há alguma restrição alimentar entre os participantes. “O que mais me impactou foi ver como as crianças vão se entendendo, elas se encontraram e já começaram a brincar”, relata Òscar Negredo, que participou como acompanhante. “No começo foi mais protocolar, depois a conversa foi fluindo naturalmente porque a vida das pessoas tem muita coisa em comum.”

Esta conexão também foi destacada por Montserrat: “senti uma profunda comunicação e proximidade com a senhora que recebemos, ela me contou coisas de sua família e eu da minha”, explica. “Seja de onde for, todos temos muito em comum, os sentimentos são os mesmos.”

Próximos passos

Após dois anos, 46 refeições, 93 famílias, mais de 300 pessoas participando e 50 entidades envolvidas, o projeto Familia del Costat foi encerrado em setembro. Tanto para a prefeitura quanto para a ONG, a experiência foi visivelmente positiva, mas agora é o momento de fazer um balanço mais profundo para avaliar novas possibilidades para a iniciativa.

Atualmente, a prefeitura estuda a possibilidade de realizar o projeto de forma mais focalizada, concentrando cada edição em um bairro. Já a SOS Racisme está em contato com outros municípios, cujas gestões locais se mostraram interessadas em realizar a iniciativa. “Construir essa relação entre vizinhos nos permite avançar e construir uma Barcelona melhor, mais justa e igualitária”, avalia Alba Cuevas. “É um caminho longo e ainda temos muito que percorrer.”

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