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publicado dia 21 de novembro de 2016

No DF, Escola na Rua articula comunidade em defesa da educação pública

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por Pedro Ribeiro Nogueira, da Plataforma Cidades Educadoras.

Em São Sebastião (DF), nas franjas de Brasília, um grupo de professores “começou a sentir uma necessidade muito grande de que a escola fosse diferente”, de que estivesse profundamente conectada com seu território e bebendo – e dando de beber – a sua comunidade. Era preciso também defender ideias públicas: tanto a escola, quanto as ruas e as praças, são do povo. E é preciso ocupá-las e fazer nelas novos territórios educativos.

Desse desejo difuso, começou a se desenhar o movimento Escola na Rua. Quem explica um pouco deste processo é Luna Lambert, que é professora da Secretaria de Educação do Distrito Federal:

“Depois de passar pela escola particular e pela pública, comecei a perceber que as reclamações eram as mesmas. Alunos desinteressados, forçados a ficarem sentados e ouvindo o que não querem. De tanto ver que aquilo não era para funcionar, percebi que era para funcionar de um jeito específico: formando mão de obra, disciplinada, para uma sociedade hierárquica e opressiva.

Brasília tem uma estrutura muito perversa, de separação entre o Plano Piloto e as cidades periféricas. E eu via que devia fazer minha parte para não reproduzir a segregação da educação que forma determinadas pessoas para determinadas funções.

A minha saída foi começar a mobilizar pessoas e abraçar outro propósito, de uma escola que esteja ligada à sua comunidade, que trabalha com o que é relevante para aquele lugar. Um espaço de produção de conhecimento local, que ajuda as pessoas viver melhor onde elas vivem. Se eu trabalho em minha rua, eu melhoro a vida para mim e para todo mundo.”

Com 100 mil habitantes, São Sebastião tem crescido exponencialmente desde 1957, inicialmente fornecendo moradias e materiais para a construção de Brasília. No entanto, moradores mais velhos contam que a região, que abriga Agrovilas, era populada por ex-escravizados. Desde 1993, sua população quintuplicou.

Escola na praça

Para concretizar esta vontade foi necessário encontrar quem sonhasse junto. Paulo Henrique Vieira de Souza, professor no Centro Educacional São Francisco de Ensino Médio, o Chicão, conta que conheceu Luna durante uma greve de professores e resolveu agir para diminuir a distância entre a escola, a comunidade e a luta docente.

“Discutir o que é escola pública é uma de nossas forças motrizes. Se o ensino é público, porque não torná-lo ainda mais?”, indaga Paulo, que se diz entusiasmado com a possibilidade de discutir em praça pública o que foge dos currículos tradicionais. “Tentar reconstruir a memória e a história da cidade, trazer pessoas para dar palestra, discutir a cultura negra na cidade mais negra do Distrito Federal, e a questão de gênero são algumas de nossas pautas prioritárias.”

Articular a comunidade

Ainda nessa busca, foram surgindo parceiros na comunidade. Luna conta que encontrou um centro budista, frequentado por jovens da região e começou a articular as primeiras atividades. A partir daí foram conectadas lideranças comunitárias, a Casa Frida, que trabalha com feminismo e empoderamento de mulheres, uma Comunidade Bahá’í que atua na região, a Horta Girassol, a maior horta comunitária do DF, e professores do “Chicão”.

Desde então realizaram três eventos na Praça 103, em São Sebastião. Construíram um parque para as crianças – “gastando apenas 90 reais e com doações”, fizeram uma roda de conversa sobre a história da cidade a partir de um escritor da região que retratou a memória do lugar e um debate sobre racismo e negritude.

Ainda dando os primeiros passos – atuam organizadamente desde 2015 – perceberam a necessidade de uma atuação mais orgânica – para além dos grandes eventos – e realizam conversas com jovens nas escolas, oficinas de permacultura, planejam exibições de filme e construção de hortas escolares, ampliando os contatos com a comunidade e com quem quer construir junto.

“A gente percebe que tem tudo dentro da comunidade. Que tem gente que faz marcenaria, serralheria, cozinha, que produz alimento, que faz banco, mesa, que ensina e aí porque não se organizar para reaver a nossa educação? É um processo de luta e de contravenção – porque as escolas estão nas mãos de governo que não estão com a gente. Precisamos dar um jeito de retomá-las”, projeta Luna.

De fora para dentro

Para Paulo, já é possível ver resultados do trabalho empreendido na escola e na forma como ele encara sua profissão docente. Ele afirma que o trabalho do Escola na Rua o ajudou a decidir ficar em São Sebastião, pois trouxe “uma luz completamente nova e um horizonte que não havia experimentado em todo meu tempo dentro das escolas.”

Princípios do Escola na Rua

Solidariedade: “Fazer pelo todo”
Proatividade: “Tem que estar junto para fazer”
Autonomia: “Precisamos pegar as rédeas da nossa existência e da nossa educação”
Sustentabilidade: “Trazer para a comunidade a permacultura e economia solidária”

“Você começa a se colocar questões como transdisciplinariedade, construção de projeto, como constituir um estudante autônomo e como ajudá-lo nessa descoberta. Tudo isso é discutido dentro da escola. Mas em um espaço que passa a ser pedagógico e fora da obrigatoriedade escolar, nós vemos resultados práticos na hora”, afirma, citando um trabalho interdisciplinar que surgiu entre as matérias de biologia, história e português no Chicão que, segundo ele, se tornou cada vez mais um apoiador ativo da iniciativa, incluindo-a em seu Plano Político e Pedagógico (PPP).

“Eu aprendo e ensino e vejo isso. Eu e o estudante interagimos nossos saberes e eu reconheço a carga que ele traz e que eu trago em pé de igualdade. A cidade favorece esse tipo de coisa. Não é casual existir em São Sebastião esse movimento, que vai se fortalecendo cada vez mais no diálogo com a comunidade, como uma construção política integrada ao território”, conclui.

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