publicado dia 30 de janeiro de 2017
Uma das piores formas de trabalho infantil acontece na praia
por Redação
publicado dia 30 de janeiro de 2017
por Redação
por Bruna Ribeiro, da Rede Peteca – Chega de trabalho infantil.
Quando é verão, quase não sobra espaço nas areias das praias do Guarujá, no litoral sul de São Paulo. Caixas de som debaixo dos guarda-sóis amplificam os hits da estação, entre o falatório dos turistas e o reconfortante barulho do mar. Circulando por tanta informação, estão silenciosas crianças e adolescentes, que usam as férias escolares para o trabalho nas barracas de comidas e bebidas.
Juliano*, de 15 anos, é um deles. Em um domingo de janeiro, com o termômetro na marca dos 30 graus, o garoto corre para dar conta de tantos pedidos. “Menino, a batida está fraca. Pede para colocarem mais vodka”, solicita uma turista. Juliano obedece.
Apesar do contato diário com bebida alcoólica, ele jura que nunca pôs sequer uma gota na boca. O peixe e a batata frita que sempre carrega em sua bandeja também passam longe. “Minha mãe me traz marmita todos os dias. É mais saudável”, conta o atendente.
Na hora do almoço, Juliano se protege do calor embaixo da barraca. Por R$ 50 diários, o menino chega à praia às 6h e encerra o expediente por volta das 19h. São, em média, 13 horas de trabalho por dia.
Tudo isso começou quando ele ainda tinha 8 anos. Logo no início, chegou a sofrer uma queimadura no braço, após a explosão do fogão da barraca onde trabalhava. Ele persistiu. Apesar de todos os riscos, tamanha disciplina o fez dele o grande orgulho da família. “Lá onde moro, os garotos da minha idade já assaltam e até matam”.
A ideia que o trabalho engrandece as crianças de baixa renda é um dos mitos do trabalho infantil. De acordo com a Fundação Abrinq, pesquisas indicam “que a maior parte dos presidiários ou adolescentes cumprindo medidas socioeducativas trabalhou na infância.”
Além disso, ressalta a organização, há diversas crianças e adolescentes trabalhando para o crime organizado, o que os torna mais vulneráveis às drogas, à exploração sexual e ao trabalho escravo.
Na barraca vizinha, o concorrente Jorginho tem uma história de vida semelhante. “Estou com mais de 50 anos e comecei a trabalhar aqui com 7, vendendo cocada”, lembra o comerciante, que já teve os filhos trabalhando ao seu lado quando pequenos. “Agora só tenho de maior, porque a fiscalização está brava”, esclarece.
Legislação
O trabalho infantil é proibido por lei e pode causar graves consequências para o desenvolvimento de crianças e adolescentes. Em fevereiro de 2014, o Ministério do Trabalho realizou uma grande operação no Guarujá.
Com três equipes de auditores fiscais do Trabalho, o objetivo era identificar se a atividade se enquadrava entre as piores formas de trabalho infantil. A classificação é adotada por vários países para definir as tarefas que mais trazem riscos à saúde, ao desenvolvimento e à moral das crianças e dos adolescentes, determinadas pela Lista TIP – Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil.
Segundo o auditor fiscal Eduardo Azevedo, o trabalho na praia se encaixa no item 81 do tópico Trabalhos Prejudiciais à Saúde e à Segurança, que proíbe o trabalho ao ar livre, sem proteção adequada contra exposição à radiação solar, chuva e frio. Além disso, o item 3 do tópico Trabalho Prejudiciais à Moralidade proíbe a venda de bebidas alcoólicas por crianças e adolescentes.
Durante a inspeção, foram identificados mais de dez quiosques e afastados até 20 adolescentes. “Determinamos a imediata saída da criança ou do adolescente do trabalho proibido, notificando o empregador para que efetue o pagamento das verbas rescisórias”, explica o auditor.
Quando possível, o empregador é notificado para que mude o trabalhador de função. Para que isso aconteça, uma das estratégias do Ministério do Trabalho é incentivar empresas a respeitarem a Lei do Aprendiz, por meio da fiscalização do cumprimento da cota de aprendizagem.
Apesar de acompanhar as inspeções e acreditar na importância da fiscalização, Azevedo entende que antes de tudo é necessário prevenir o trabalho infantil. “Devemos evitar que a situação chegue a este ponto, pois são as condições sociais, familiares e econômicas que levam a criança ao trabalho. Muitas vezes os pais, com tantos problemas, não encontram outras saídas. É papel do Estado garantir a proteção dessas pessoas.”
*O nome foi alterado para preservar a identidade do entrevistado.
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