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publicado dia 26 de abril de 2019

Educação Integral em debate

por

Por Natacha Costa (Associação Cidade Escola Aprendiz) e Pilar Lacerda (Diretora da Fundação SM)

Em diálogo com o artigo publicado no dia 26 de abril de 2019 no jornal Folha de S. Paulo, intitulado “Educação Integral ou oficinas de contraturno?”, gostaríamos de tecer algumas considerações com o objetivo de contribuir para a ampliação e aprofundamento deste importante debate.

Concordamos, sem dúvida, com a visão de que qualquer proposta que tenha lugar na escola deva estabelecer uma clara intencionalidade pedagógica, estar integrada ao currículo e contar com permanente processo de monitoramento e avaliação que permita reorientações necessárias ao alcance dos objetivos, além de formação dos profissionais envolvidos e recursos humanos e materiais adequados. Essas condições devem ser criadas por políticas públicas comprometidas com a qualidade da educação oferecida aos nossos estudantes. Nesse contexto, a média brasileira de jornada escolar é, sem dúvida, insuficiente e este ponto está entre as condições que precisam ser criadas, como bem estabelece o Plano Nacional de Educação, a lei vigente na qual devemos nos pautar.

Discordamos, entretanto, de alguns pontos elencados pelo artigo. Os diferentes modelos de Educação Integral implementados no país, entre eles os que contemplam oficinas, foram criados para responder a alguns desafios que nos parecem ser da maior relevância em um país como o Brasil, entre eles:

– a diversidade de contextos: o Brasil é um país marcado por uma complexa diversidade atravessada por múltiplas desigualdades. Nesse cenário, é fundamental a proposição de políticas que reconheçam os diferentes territórios e que possibilitem diferentes soluções para diferentes contextos;

– a participação de agentes das comunidades em oficinas, como acontece em algumas cidades brasileiras, têm objetivos fundamentais para o enfrentamento das desigualdades: a maior integração das escolas às comunidades, o reconhecimento dos saberes populares na construção dos currículos escolares, a necessária apropriação por parte das escolas das questões identitárias (raça, gênero, religião, etc.), e das condições de vida dos estudantes. Uma escola que não reconheça com clareza quem são seus estudantes e as comunidades onde se inserem terão (têm) muita dificuldade de construir processos educativos com sentido e significado para todos e todas;

– a LDB estabelece como princípio a autonomia escolar. Esse ponto não é uma abstração e nem uma ideia sem sentido. Do ponto de vista pedagógico, a construção de propostas educativas contextualizadas é condição sine qua non para o alcance de resultados. Não há aprendizado sem vínculo e pertinência. Esses são elementos singulares do contexto educativo sem os quais propostas comprometidas de fato com uma aprendizagem contemporânea e o desenvolvimento integral não terão resultados;

– a Educação Integral deve ser entendida como uma concepção, uma proposta que tem a formação integral como fundamento pedagógico. Dessa maneira, não é o tempo que a define. Uma escola com jornada parcial pode ser uma escola de educação integral (e muitas no Brasil o são). Por outro lado, uma escola com jornada ampliada pode ser uma escola de educação integral. Como pode não ser. Há que se analisar em profundidade, portanto, os modelos com critérios claros orientados pelo compromisso com a formação integral de todos e todas.

– a importância de não agravarmos o quadro de descontinuidade de políticas ou assumirmos políticas que só terão efeito a longuíssimo prazo por desconsiderarem o conhecimento acumulado no país, consideramos fundamental conhecer as diferentes pesquisas nacionais que revelam o ineditismo o os impactos da ampliação de jornada na perspectiva da Educação Integral.

Por fim, gostaríamos de analisar, ainda que brevemente, a proposta de Pernambuco. Sem dúvida, é uma proposta que merece atenção pelo alcance e influência que vem atingindo nos últimos anos. Entretanto, é importante lembrarmos que se trata de um modelo fechado e padronizado, oferecido por uma organização com (alto) investimento privado, com qualidades, mas também com inúmeras limitações do ponto de vista pedagógico e que, ao ser implementado, se converte em um alto investimento por parte dos cofres públicos. Assim, é muito importante considerarmos este como um modelo a ser estudado e com o qual podemos aprender, mas pelas razões enumeradas acima, não deve ser o único se quisermos construir políticas comprometidas com a superação das desigualdades e com a diversidade que nos constitui.

Esperamos que estas reflexões possam contribuir para o fortalecimento deste debate fundamental ao país, com respeito à pluralidade de ideias e em nome do propósito maior que nos une: a garantia do direito de todos e de cada um a uma educação brasileira contemporânea e de qualidade social.

Atualizado às 18h13 de 26/4/2019

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