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publicado dia 14 de fevereiro de 2014

Copa: Governo e sociedade precisam agir para proteger crianças

por Yuri Kiddo, do Promenino

A grande preocupação às vésperas da Copa do Mundo é que o evento pode ser um potencializador das violações de direitos humanos já existentes. A situação é especialmente delicada para crianças e adolescentes. O Estado brasileiro ainda tem dificuldades em garantir que crianças sejam prioridade absoluta, como determina a Constituição. As políticas públicas ainda são precárias e ficam bastante comprometidas diante da prioridade dada ao Mundial. Enquanto grandes estádios se erguem, às sombras deles estão o trabalho infantil, trabalho precarizado, as inúmeras remoções e despejos, higienização dos espaços públicos, tráfico humano e abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes.

De acordo com um dos coordenadores do Centro de Defesa de Direitos da Criança e do Adolescente do Distrito Federal (Cedeca/DF), Rafael Madeira da Veiga, ainda é pífio o investimento no Sistema de Garantia de Direitos de Crianças e Adolescentes, com especial atenção ao órgão que faz o atendimento na ponta. “Por mais que haja uma considerável abrangência de conselhos tutelares no território brasileiro, em sua maioria são bastante precarizados”.

Para a secretária da Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa (Ancop), Larissa Araújo, o País também não está preparado para lidar com violações dos direitos das nossas crianças e adolescentes. “Infelizmente, o aparato de proteção está funcionando segundo padrões ‘normais’, o que é bastante desalentador, visto que a normalidade da proteção, geralmente significa pouco apoio às redes de proteção, aos conselhos tutelares e à assistência social.”

Desde 2013, a articulação reúne comitês nas 12 cidades-sede da Copa, que por sua vez agregam movimentos sociais, universidades e entidades de sociedade civil que lutam contra as violação de direitos humanos. “Uma sociedade organizada e consciente dos seus direitos pode ser o maior legado do evento. Ações e orçamentos devem ser planejados no sentido de fortalecer a rede de proteção, tanto a institucional quanto a desenvolvida pela sociedade civil”, explica a militante da Ancop.

[stextbox id=”custom” caption=”Despejos” float=”true” width=”250″]Um mapeamento divulgado em 2013 pela Ancop em parceria com a ONG Conectas, calcula que mais de 200 mil pessoas estão sendo despejadas de suas casas por conta das obras referentes à Copa do Mundo nas 12 cidades-sedes. No Mundial da África do Sul, em 2010, o número de despejos chegou a 20 mil pessoas.[/stextbox]

Vulnerabilidade sintomática

De acordo com o coordenador do Movimento Nacional dos Direitos Humanos (MNDH), Rildo Marques, as negligências estatais acontecem há muito mais tempo, e que não será agora que haverá eficácia nas medidas de proteção. “Antes de falar da Copa, temos que falar que as forças conservadoras vivem atacando o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). Elas têm conseguido colocar representantes nos governos locais, que além de não incorporarem o Estatuto, ainda defendem contra alguns itens essenciais para a proteção das crianças e adolescentes.”

Marques aponta que não houve preparação para a implementação do ECA desde sua criação, 24 anos atrás. “A sociedade não assimilou a política do cuidado integral da criança como deveria. Ainda vivemos de forma latente as violências contra crianças como o trabalho infantil e a exploração sexual.”

O coordenador destaca a possibilidade de aumento no trabalho infantil durante os megaeventos. “A sensação que eu tenho é que vamos ter crianças e adolescentes se aproveitando do turismo como uma forma de renda extra. Não há uma campanha que previna isso na prática.” “Deveríamos estar num processo muito avançado de prevenção e não repressão”, afirma Marques.

Até agora

Embora existentes, as campanhas de proteção às crianças ainda não tem grande abrangência. “Há pouca informação sendo veiculada nas redes hoteleiras, aeroportos, taxis, etc. Também é bastante comum em megaprojetos o aliciamento de crianças e adolescentes para a exploração sexual”, afirma Larissa.

Para o coordenador do Cedeca, essa é uma das violações que mais preocupam, tendo em vista que ainda é uma prática muito comum nas cidades brasileiras e não temos um sistema eficiente de prevenção e repressão desses crimes. “Aliado a isso, muitos turistas são estimulados a realizarem viagens ao Brasil com a possibilidade de contratar serviços sexuais de crianças e adolescente. A rede hoteleira e de restaurantes ainda, na sua maioria, não é parceira na prevenção da exploração sexual.”

[stextbox id=”custom” caption=”Desapropriação” float=”true” align=”right” width=”300″]Desde 2011 a Relatoria Especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para a Moradia Adequada alerta o governo brasileiro sobre as violações de direitos em casos de remoção de comunidades em diversas cidades como São Paulo, Porto Alegre, Fortaleza, Recife, Belo Horizonte, Natal, Curitiba e, principalmente, Rio de Janeiro, também por conta das Olimpíadas.  Há denúncias de falta de transparência nas ações do Poder Público, ausência de diálogo e negociação prévia de projetos de remoções e alternativas, além de especulação imobiliária em função da valorização da terra.

De acordo com a secretaria da Ancop, Larissa Araújo, as crianças são as que mais sofrem os impactos das desapropriações. Quando há a expulsão, há a perda da rede de serviços e do entorno comunitário, desconstrução de laços, perda do ano letivo escolar e uma carga de violência simbólica, uma vez que há o medo do futuro em relação às suas moradias. Além disso, as crianças ficam vulneráveis a violências, abusos e a condições de sobrevivência indignas.[/stextbox]

Nesse sentido, há algumas iniciativas sendo realizadas como a da Childhood Brasil, ONG que atua na proteção da criança e do adolescente, com foco na exploração sexual. “Fizemos uma ação com alguns hotéis para que identifiquem, impeçam e denunciem qualquer tipo de pessoa que esteja acompanhada de criança ou adolescente sem os documentos necessários”, explica a coordenadora de programas da organização, Anna Flora Werneck. “Principalmente em cidades litorâneas, há um menu de crianças e adolescentes que são oferecidas em pacotes de turismo sexual. Além das campanhas, precisa haver mobilização da sociedade.”

Além disso, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR) está apostando na Agenda de Convergência para a Proteção Integral de Crianças e Adolescentes em Grandes Eventos. A iniciativa consiste em um pacto entre os poderes públicos, com a instalação de comitês locais de atendimento e encaminhamento de crianças e adolescentes para a rede de proteção integral durante os jogos e eventos da Copa.

“É uma iniciativa inovadora que busca trabalhar um plano estratégico convergente, com diferentes ministérios e órgãos para que as ações sejam mais assertivas. Naturalmente ela vai coordenar todos os comitês para termos uma rede muito articulada”, explica Anna. Porém, a coordenadora destaca que a sociedade também deve cumprir seu papel. “Como um todo, temos que nos conscientizar para ajudar na identificação e na denúncia de crianças em situação de risco. Com a população organizada podemos ter um serviço benéfico.”

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